Quando não me sinto bom o bastante

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“Se você encontrar um caminho sem obstáculos, ele provavelmente não leva em qualquer lugar”. - Frank Clark

Apesar de racional, o processo de aprendizagem também envolve o lado emocional. Durante ou mesmo antes de iniciar uma sessão de estudos, você leva muito de si para os livros e cadernos… No meu ensaio, A Dificuldade Como Métrica do Esforço, levei em conta apenas o contexto intelectual do estudante, mas, apenas empregar técnicas não é condição suficiente para aprender com eficiência. Como complemento ao primeiro ensaio, quero levar em conta o ‘antes’ e o ‘depois’, os outros aspectos que, direta ou indiretamente, influenciam a vida de qualquer pessoa que se esforça em aprender algo, seja um aluno (alguém matriculado numa instituição de ensino) ou um estudante (que pode ser um aluno estudando sozinho ou um autodidata sem qualquer tipo de mentoria personalizada, ou seja, um professor).

Como muitos estudantes de ciências exatas, já passei pelo drama de reprovar em disciplinas de matemática. Cálculo Diferencial Integral, Geometria Analítica e Álgebra Linear… Se essas disciplinas fossem personagens, elas poderiam muito bem protagonizar um filme de drama, pra te fazer chorar, perder o sono e o apetite ou seriam estrelas num filme de terror, pra te assombrar com gargalhadas mordazes e causar calafrios.

Certa vez, angustiado com meu desempenho numa disciplina de matemática da graduação, escrevi um e-mail de desabafo para o professor que, ao contrário da minha visão negativa da disciplina, era compreensivo e compreensível. Parte da resposta amorosa e incentivadora que ele me deu (e nunca vou me esquecer), foi: “Realmente a matemática é um leão que, às custas de paciência e trabalho, vira um gatinho, ou pelo menos uma jaguatirica… Nós aprendemos a domar a jaguatirica!” Eu gostaria que todos tivessem professores com essa disposição mental, o que me leva ao próximo tópico.

Como lidar com o medo de errar

Você já ouviu falar em mindset? É uma palavra da língua inglesa que se refere à sua disposição mental, de uma forma mais resumida, é a forma de compreender a sua situação atual e agir sobre ela. A forma com que você se enxerga influencia diretamente nas decisões que você toma. Mesmo que isso já tenha embasamento científico, também é algo intuitivo, afinal, se eu acredito que posso aprender a dirigir um carro, por exemplo, as chances de fazê-lo são consideravelmente maiores do que alguém que pensa negativamente sobre isso.

Imagino que você já sabe onde quero chegar: ‘se acredito que posso aprender um conteúdo difícil, então estou mais perto de obter sucesso’. Um estudo publicado no Journal of Consumer Research, se baseia na percepção de que a linguagem que usamos para descrever nossas escolhas pode melhorar ou nos impedir de alcançar um objetivo específico. É aqui que gostaria de enfatizar a grade importância de se conhecer bem, isso ajudará a ajustar nosso mindset para o objetivo a ser alcançado. Se você tem dificuldades com matemática, por exemplo, trabalhe para identificar a causa por trás disso. Pode ter sido um professor negligente ou talvez você não tenha recebido apoio em casa de que tanto precisava para lidar com os desafios… Quando encontrar a causa por trás da dificuldade vai perceber que ela não tem a ver com a matemática em si, mas na forma que te apresentaram a ela.

Outra coisa importante a se considerar aqui é: saber a causa do medo não tornará o processo de aprendizado mais fácil, mas pode te mostrar caminhos a evitar e torná-lo administrável. Assim, você estará mais preparado para lidar com suas falhas. Sim, elas vão acontecer, provavelmente aos montes. Aliás, se você só acertar, é um sinal de que não está sendo desafiado, logo, não crescerá. Não pense que os gênios encontram um caminho fácil. Eles podem até ter um caminho menos doloroso em certos aspectos, mas precisam enfrentar seus próprios desafios. Além disso, talento inato não é o bastante para ter sucesso numa área. Assim como pessoas que não possuem ‘o dom’, eles precisam praticar muito, muito mesmo, até atingir a maestria.

O ponto chave ao se lidar com as falhas, em qualquer momento da vida, está na maneira como agimos frente a elas. Nessas horas, tendemos a ser nossos piores críticos e nos autossabotamos. E então, o que fazer? Desenvolva a autocompaixão! Isso não é fácil, exige prática. Lidar com nossos próprios gatilhos internos, cujas reações já foram automatizadas ao longo da vida, pode ser mais desafiador do que a própria falha em si, mas é fundamental para manter a saúde mental que, por sua vez, também é fundamental para se obter sucesso em qualquer área da vida, inclusive as que não têm qualquer ligação com a sua profissão ou vida acadêmica. Portanto, invista nisso!

Pessoalmente, eu só consegui lidar bem com isso tudo depois de buscar ajuda profissional. Conversar com alguém, colocar pra fora toda a ‘bagunça mental’, vai ajudar a colocar as coisas no lugar. Ter uma visão diferente da sua pode ser uma benção. Além de mostrar que você não precisa lidar com tudo isso sozinho, vai tornar evidente coisas que você não tinha percebido. É uma experiência interessante! Uma das dicas mais valiosas que eu aprendi foi de conversar comigo mesmo como se eu falasse com um amigo estimado.

Vou contar uma experiência recente. Eu tinha um exame do DETRAN agendado… Pouco antes do horário, também tinha marcado de encontrar uns amigos que não via há um tempo. Eu até saí há tempo pra chegar no horário do exame, mas não conhecia bem o caminho e fui enganado pelo aplicativo de mapas. Sim, isso aconteceu! Você pode imaginar minha frustração ao ter que reagendar o exame e ainda ter que pagar uma taxa por isso? Minha primeira reação, desencadeada pelo gatilho interno, foi de me dizer coisas bem ruins. Mas, depois de um tempo, enquanto caminhava para casa, pensei comigo: “Eu sou uma das pessoas mais pontuais que conheço, inclusive fui o primeiro a chegar na sorveteria pra ver meus amigos. Isso que acabou de acontecer é algo bem incomum: perder um horário! Se fosse um amigo meu e o encontrasse chateado com isso, eu diria algo como: ‘poxa, você nunca se atrasa, é uma das pessoas mais comprometidas que eu conheço e o aplicativo te atrapalhou por você não conhecer bem o caminho, você até mesmo saiu a tempo…’” Cheguei em casa bem mais calmo! Quase que rindo da situação: “fui enganado pelo aplicativo de mapas…” Depois desse acontecimento, percebi que ficou bem mais fácil de lidar com esse tipo de situação e ainda me senti bem por ter sido gentil comigo mesmo. Aliás, fazer longas caminhadas, sozinho, é incrivelmente útil, recomendo!

Meus colegas aprendem muito mais rápido que eu!

Esse é outro desafio bastante comum. Senti isso na pele e meu primeiro impulso foi tentar alcançar o ritmo deles, mas isso me frustrou ainda mais. Muito mais importante que entender é aceitar a situação. Ser mais rápido não é sinônimo de ser mais forte, assim como ser mais lento não significa ser incapaz. Quer dizer que o processo de aprendizado é diferente. Portanto, não fique com inveja de seus colegas se eles não precisam estudar tanto quanto você para aprender algo. Na verdade, se você fizer isso direito, pode até ser uma vantagem! Por quê? Imagine esse cenário: num percurso, existem os motoristas que são mais velozes e, eles deverão chegar primeiro ao destino. Mas a experiência deles será outra. Ao contrário do mais veloz, que terá menos tempo para apreciar as paisagens à sua volta, sentir os cheiros, perceber as nuances... O motorista mais lento lembrará de todos esses detalhes e talvez até chegue ao seu destino com mais tranquilidade, talvez conversando com os outros no carro, ouvindo música enquanto dirige… Entende onde quero chegar?

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Mesmo que eu me concentre na matemática aqui, isso não fica restrito a ela. Qualquer área de conhecimento é complexa. Inclusive, tenho amigos campeões em matemática, mas que têm aversão a escrever um texto, seja ele técnico ou não, por considerar difícil. Nenhum assunto é difícil de mais pra se aprender. Como mencionei no artigo citado acima, alguns fatores tornam certos conteúdos mais desinteressantes e até intimidadores. No seu caso, assim como no meu, pode ser a matemática. Gostaria de abordar duas possíveis causas pra isso usando afirmações frequentes e refutá-las apropriadamente:

1ª Afirmação: Não nasci para os números, não tenho cérebro de exatas!

Se você leu meu artigo anterior, lembrará de que exposição a determinados elementos desde a infância tem forte influência nas nossas habilidades futuras e, no geral, a primeira preocupação dos pais é com o desenvolvimento da fala e não com o desenvolvimento matemático. Via de regra, isso já nos deixa em desvantagem, tendo que compensar isso depois. Aprender matemática não é natural pra nós, não mais do que ler, escrever ou falar. Mas, à medida que você se expõe ao novo conteúdo, ficará mais natural com o passar do tempo. A exposição, junto do seu novo mindset de crescimento, vai te colocar no ‘trilho dos números’.

2ª Afirmação: Por que aprender essas coisas? Não vou usar isso na prática!

Se eu dissesse que todo programador ou engenheiro precisa derivar ou integrar pra viver, ou mesmo que trigonometria é fundamental pra qualquer emprego depois de terminar o ensino médio, estaria contando uma grande mentira! Então, você pode argumentar que nem todos precisam aprender essas coisas. Por que aprendemos, então?

Certa vez, Steve Jobs, co-fundador da Apple Inc., disse: “Todos deveriam aprender a programar um computador, porque isso ensina a pensar.” Assim como a programação, a matemática desenvolve em nós uma aptidão mental que é extremamente útil para a resolução de problemas, mesmo os que não têm qualquer abordagem matemática ou computacional. Sei que é difícil entender isso, até porque a forma tradicional de se ensinar não é exatamente eficaz para desenvolver isso em nós, mas desenvolver o pensamento matemático e/ou computacional auxilia na formação de estruturas cerebrais que nos farão pensar de forma mais organizada e objetiva. Então, mesmo que suas aulas de matemática sejam entediantes, pra não dizer chatas, às vezes, esforce-se para permitir ser beneficiado pelos ‘efeitos colaterais’ positivos de se aprender matemática, mesmo que você não pretenda ser um teórico da área ou participar de competições para encontrar o próximo número primo ou a próxima casa decimal de Pi.

“Educai as crianças, para que não seja necessário punir os adultos” - Pitágoras

Considerações finais

Depois de ler até aqui, você pode pensar: “parece muito bonito na teoria, mas na hora de executar…”

Num dia qualquer, entrei no laboratório e escutei meu professor criticando o trabalho de coaching. Concordei com ele em grande parte, mas, entrando na conversa, argumentei que tinham profissionais bons e éticos também. Nessa hora, ele me perguntou: “Giorgio, então você quer mudar de vida em dez passos?” E nos divertimos juntos quando eu respondi: “Não professor, são só seis!” Não sou coach, contei essa anedota só pra dizer que, de fato, falar é bem mais fácil que fazer! Mas, e então?

Ouvir ou ler as experiências que narrei aqui são úteis pra mostrar que não estamos sozinhos com nossos desafios. Aprender com o erro dos outros ou obter conselhos de quem já passou por algo parecido também é útil e fortalecedor, apesar de serem insuficientes.

Então, aceite que você sempre vai encontrar novos desafios, que as soluções podem demorar a vir… Mas, esteja disposto a prosseguir buscando, cada vitória valerá seu empenho e não se esqueça de comemorá-las!

“Você não pode mudar o vento, mas pode ajustar as velas do barco para chegar onde quer.” - Confúcio

Giorgio Braz

Giorgio Braz

“As grandes coisas não são feitas por impulso, mas através de uma série de pequenas coisas acumuladas” - Vincent Van Gogh

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